[Escrevendo No Escuro #06] Um texto sincerão sobre oportunidades para roteiristas no mercado audiovisual
Este é para você, que está com a mão ferida de tanto dar murro em ponta de faca. Um texto que não se limita à escrita de terror, mas que representa nosso gênero também.
Citação da vez: "Escrever é um trabalho solitário. Ter alguém que acredita em você faz toda a diferença". (Stephen King)
Cerveja, rodadas de negócios e salas de roteiro
Desde que me joguei no mercado, escuto dicas de como estabelecer contatos promissores para conseguir vagas em salas de roteiro ou na área de desenvolvimento de produtoras. O denominador comum, escutado em todas as conversas que tive, é "vá a eventos para conhecer produtores e roteiristas experientes que te ajudarão a entrar em salas e desenvolver projetos, e fique mais tarde para o bate-papo no bar, porque a coisa acontece no bar".
Pois, segui essa dica. Fui a eventos no Brasil e fora dele e fiquei para o bate-papo no bar, bebendo água e suco de laranja enquanto todo mundo se afogava em cerveja. Conheci pessoas legais e fiz amizades sinceras, sem dúvidas. Mas, verdade seja dita, em nenhum desses eventos consegui a ponte com a tão desejada oportunidade em salas de roteiro.
Foi em um pitching online que conheci a Laura Barzotto, que viria a tornar-se produtora do meu longa-metragem de suspense. E foi no grupo de desenvolvimento de roteiro avançado do Centro Cultural Marieta que conheci a Rastricinha Dorneles, a qual se tornaria diretora e produtora do meu primeiro curta-metragem de animação de terror.
Rodadas de negócio de grandes eventos? Participei de quase todas, mas nenhuma delas me trouxe algo concreto — nem a curto, nem a longo prazo. Bar pós-evento? Fui a vários. E, como disse anteriormente, ganhei bons amigos e zero oportunidades de trabalho.
Fico pensando, cá comigo, na eficácia real desse denominador comum. E se não é ele o melhor caminho para ingressar no grande mercado de fato, qual seria, então? Conversando com uma amiga no sábado, a qual trabalha em uma grande produtora e lida diariamente com players brasileiros, estadunidenses e europeus, ouvi algo que me deixou matutando até hoje.
Ela me disse: "nunca fui a nenhum desses grandes eventos de roteiro e não acredito que os projetos vinguem a partir de reuniões em rodadas de negócios; verdade seja dita, se as produtoras têm a possibilidade de investir em um ou dois projetos, por que haveriam de investir em roteiristas inexperientes, em vez de profissionais com os quais já trabalharam antes e/ou dos quais possuem boas referências? Para mim, o que funcionou, foi me inscrever em concursos de roteiros relevantes, para que fosse lida de fato e, então, contatar membros do júri que, depois de conhecer minha escrita, poderiam me ajudar a estabelecer contatos com produtores a partir de uma referência sólida."
Ao refletir sobre a fala dessa amiga, me lembrei do que a Laura Barzotto, enquanto coordenadora de produção executiva, disse aos alunos do meu curso O Drama É Dark: "não há um único caminho, há o caminho que funciona para você".
Este, portanto, não é um texto para dizer que ir a grandes eventos de roteiro, participar de rodadas de negócios e ficar para as conversas no bar não funcionam. Trata-se de um texto para dizer que este pode não ser o caminho para você, assim como não o foi para mim.
A importância de ter o contato certo na hora certa
Sabe aquela situação clássica do “estar no lugar certo na hora certa”? Bem, tem algo de sorte nesse tipo de oportunidade, sim. Mas é inegável que ninguém cai de pára-quedas no sucesso. Para estar no lugar certo na hora certa, acredito que temos que ir a vários lugares e nas horas mais inusitadas. Afinal, se o contato e a oportunidade que buscamos está em um único lugar, em uma única hora (evento grande + bar ou qualquer combinação perfeita dita por aí), o que fará de nós os alecrins dourados a serem notados no meio do mar de roteiristas que estão ali, no mesmo lugar e na mesma hora, com o mesmo objetivo?
Vejo roteiristas estabelecidos no mercado, com anos e mais anos de experiência, fazendo um rebranding em suas redes sociais. Em 2022, durante o FRAPA, tive uma conversa com um deles que me confessou ter sido incentivado por seu agente a estar mais ativo no instagram para fortalecer sua imagem enquanto roteirista no universo digital, mostrando suas conquistas ao público, compartilhando suas experiências e os eventos exclusivos que frequenta, junto à elite cultural de São Paulo.
Esse roteirista já consagrado, por exemplo, talvez não precise estar no lugar certo na hora certa, mas sim mostrar aos seus seguidores que se mantém no lugar certo na hora certa. Algo louco de se pensar, convenhamos. Não basta ser, é preciso aparentar.
Seguindo essa lógica, entretanto, caio em outra reflexão. Esse e outros roteiristas consagrados que precisam aparentar, embora já sejam, vão na contramão das dicas “aparente ser diante das produtoras para, então, enfim, ser". Desestrutura, talvez, a ideia de que é preciso mostrar confiança em seu suposto trabalho impecável durante reuniões com grandes players para, só depois, ter um trabalho impecável de fato (se é que o impecável existe).
A velha escola, que tornou-se antes de aparentar, me dá certa esperança em um caminho que sinto ter mais a ver comigo. Talvez, eu tenha nascido (ou começado a trabalhar com roteiro) mais tarde do que deveria e precise me adaptar ao bar, à confiança inabalável nas rodadas de negócios e ao aparentar, antes de ser. Ou, talvez, só precise de um grande produtor que decida ler o que eu escrevo para conhecer minha escrita de fato, em vez de continuar dando murro em ponta de faca em eventos que me dão ótimos amigos e nenhum contrato importante.
Para você, que está estabelecido no mercado e tem fé no tornar-se antes de aparentar:
É produtor ou conhece um produtor que acredite na escrita de talentos promissores (os quais não aguentam mais tomar suco em busca de contatos no bar)? Então, me conheça.
Trabalho com escrita literária de ficção e roteiro audiovisual. Em ambos casos, me dedico a desenvolver narrativas de terror, suspense e dramas sombrios. Você tem uma sala de roteiro na qual eu possa me encaixar ou conhece um contato certo na hora certa para mim? Então, me escreva: contato@fernandachazan.com
Interessantíssimo seu relato. Não pretendo entrar no mercado de roteiros, mas tenho um interesse pela área a nível de curiosidade. Me parece dificílimo encontrar os caminhos de entrada
Estou há mais de dois anos participando de rodadas de negócios, algumas reuniões, mais de 1000 e-mails enviados para roteiristas, produtoras, produtores, diretores, atores, VIPs e executivos. E nada! O engraçado é que respondem que, quando houver uma oportunidade, vão me chamar. E nunca me chamam. Não sei se é uma resposta padrão para ser educado e dizer que estão abertos a roteiristas estreantes. Fiz uma websérie autoral de drama/terror @webserievalquiriaaescolhida com uma atriz maravilhosa que topou a empreitada. A websérie está disponível no Instagram e YouTube. Pouca visualização e nenhum contato. Não sei mais que caminho devo seguir. Quero fazer como o maravilhoso Rupert Pumpkin; acho que, se eu fizer isso, vou ganhar atenção.